A facilitação do processo de coaching utilizando a arte como ferramenta
Texto de Cristina Henriques*
Há muito se sabe que a arte é uma ferramenta essencial do desenvolvimento da capacidade de aprender. Quando “brincamos” com a frase “quer que eu desenhe”, queremos dizer isso mesmo. Através do desenho, do esquema e da concretização da ideia, abre-se uma conexão onde são acessados conhecimentos mais profundos ampliando-se a capacidade de aprender.
A arte é uma linguagem expressiva e uma forma de se obter conhecimentos através do fazer, do experimentar. É uma ferramenta que ajuda a compreender o meio social de maneira mais ampla. Possibilita um comportamento mental que leva a comparar coisas, a passar do estado das ideias para o estado da comunicação, a formular conceitos e a descobrir como se comunicam esses conceitos.
A arte desenvolve a criatividade, gerando respostas mais inventivas para melhor adequar-se ao Mundo, para apontar problemas e propor soluções. Na arte não tem certo ou errado, pode-se ousar sem medo, explorar, experimentar e revelar novas capacidades.
Outra razão para o uso da arte é a liberdade de expressão: é uma forma de impedir que a autocrítica impeça o coachee de representar tudo o que sente e é necessário para o aprofundamento do seu processo.
Arte como ferramenta no processo de coaching
A Arte pode ser uma ferramenta das mais importantes no processo de Coaching, poderoso facilitador para uma conexão profunda e caminho para a base do questionamento. Na verdade, a Arte oferece a oportunidade para uma conexão interior e para uma escuta de si e do outro diferenciada, funcionando como um “meio de comunicação” na busca do conhecimento essencial de cada pessoa.
Nas sessões de Coaching, pode-se utilizar qualquer meio de expressão artística, como: desenho, pintura, modelagem, escultura, dança, teatro, contação de histórias, colagem, fotografia, vídeos, entre outros, sempre com o objetivo de promover uma profunda expressão do que não é dito e, muitas vezes, desconhecido pelo próprio coachee.
A produção artística é consequência de processos primários de elaboração psíquica e, portanto, sugere a possibilidade de não passar pela autocritica. Cada técnica ou projeto artístico responde de diversas maneiras às questões propostas pelo coach e pelo coachee, considerando que os dois são partes integrantes do processo, e podem ser repetidas no desenrolar do mesmo, através de uma infinidade de atividades plásticas e expressivas diferentes. Elas trazem, para a consciência, questões que aparecem no desenho ou no relato sobre o desenho, com o surgimento de sensações corporais e insights.
Teoria U e Arte
A Teoria U propõe que a qualidade dos resultados que criamos em qualquer tipo de sistema social seja função da qualidade de consciência e de atenção com que os participantes do sistema operam. A seguir, apresento sugestões práticas para acompanhar o coachee nessa jornada, fundamentada na metodologia do U.
1º passo – Co-iniciar – Definição da Intenção
Buscando a capacidade de suspender a Voz do Julgamento (VOJ) e atender a situação em questão. Olhar com um novo olhar. Nesse passo, há a necessidade da investigação da questão.
- Objetivo da Utilização da Arte → Facilitar a investigação da questão, ter uma nova visão do “problema”.
– Sugestão de Ferramenta Artística
- Jogo das Portas – descrição
- O coach conversa com o coachee que fará um jogo de portas:
- Nele, o coachee se depara com diversas portas que serão abertas para a investigação da questão. O coach descreve um cenário com portas, com número adequado à necessidade do momento e, convida o coachee a abri-las. As portas, necessariamente, têm que pertencer ao universo do coachee.
- A seguir, após a descrição, o coach pede que o cliente abra uma das portas, e pergunta o que há do outro lado da porta?
Atenção, o foco é a situação contratada anteriormente.
- Observações:
- A atividade deve ser conduzida de forma fluida, com muita imaginação e sentimento.
- Pode-se abrir quantas portas forem necessárias até completar a investigação.
2º passo – Co-sentir: Buscar locais mais profundos de aprendizagem
Uma jornada de sentir não é uma viagem comum. É um mergulho profundo no contexto que se está experimentando.
- Objetivo da Utilização da Arte – Traçar um cenário sobre a situação com a partir do sentir, silenciando a voz da razão.
– Sugestão de Ferramenta Artística
- Colagem
- A colagem pode ser uma boa ferramenta para essa etapa. Com ela, pode-se desconstruir e reconstruir a história através de um novo olhar.
- As colagens podem ser feitas de várias maneiras e trazer revelações pela alternãncia da experiência de observador e observado.
- Quanto à sua forma, elas podem ser multifacetadas (ou na forma de mosaicos), criando uma nova “imagem”; ou, por exemplo, mantendo a integridade das partes como numa “história” da própria pessoa.
- São necessárias grande concentração e disponibilidade do coach para observar a confecção da colagem e para escutar o que foi “relatado” durante e a partir da atividade.
3º passo – Presencing – Conexão à fonte de conhecimento interno
Um limiar profundo precisa ser cruzado para se conectar com a fonte real de presença, criatividade e poder.
No estado de Presencing, aparecem perguntas como “Quem sou Eu?” e “Qual o meu Trabalho/Propósito?”.
É quando se faz o movimento do “eu” em direção ao “Eu”, do estado atual do ser ao seu Eu essencial, ao Ser que está querendo emergir. Também é o estado em que se movimenta do Conhecimento (analítico) à Sabedoria (conhecimento original ou interior), eliminando a separação entre a Mente e o Mundo e experimentando a unicidade.
Intenção → Deixar ir → Fluxo
- Objetivo da Utilização da Arte → busca do conhecimento original ou interior.
– Sugestão de Ferramenta Artística
Para esse passo, tão importante, sugiro duas ferramentas:
- Para o “Deixar ir” → trabalho com argila
- Mentalizar o que é necessário deixar para trás para que o novo emerja.
- Construir com a argila o que deve ser deixado, mesmo que a forma não seja reconhecida, trabalhe com o sentimento do coachee, qual a percepção que ele tem sobre o que foi produzido.
- Para o Questionamento è Construir um novo cenário sobre o questionamento com guache sobre papel molhado
- Molhe uma folha de papel canson grosso;
- Peça ao coachee para imaginar o futuro emergente;
- Peça para que ele pinte o que está sentindo sobre esse futuro;
- A partir do trabalho, dialogue com o coachee sobre sua produção;
Atenção: é muito importante o acompanhamento do que se está produzindo, inclusive os comentários que são feitos durante a pintura;
Quanto mais intensa a conexão, melhores serão os resultados.
- Observações:
- O papel é usado molhado para que o coachee tenha menos controle sobre o que está pintando, para que o novo emerja dos seus traços e não se reproduza estereótipos como bonecos de palitinhos e casinhas.
- Caso o cliente fale que não sabe pintar, peça para ele sentir e ir traduzindo o sentimento para o papel em cores e gestos.
4º passo – Co-criar – Cristalizar a visão e a intenção
Perceber o que está querendo emergir no campo onde se está atuando.
“Como perceber e se aprofundar no campo: diálogos e momentos de quietude para que as percepções possam emergir.” (Mônica Alvarenga)
- Objetivo da Utilização da Arte → Movimento de cristalizar.
– Sugestão de Ferramenta Artística
- Mix de técnicas → Construção de colagem e desenhos esquemáticos
- Peça ao coachee para fazer uma colagem do que está parecendo emergir e, a partir da colagem, peça que ele desenhe, esquematizando e organizando o pensamento;
- É hora da quietude e de ampliar a visão do coachee. Ajude-o, através de conversas, a aprofundar a sua questão e o desenvolvimento dos seus insights sobre a questão trabalhada;
- Ressalto que é muito importante o acompanhamento do que se está produzindo, inclusive dos comentários que são feitos durante a atividade.
5º passo – Prototipagem – REALIZANDO E TESTANDO
- Objetivo da Utilização da Arte → Ajudar a testar as soluções, experimentar
A prototipagem exige múltiplas ferramentas de arte. Dependendo da questão, pode-se utilizar tissue art (arte com papel de seda), pinturas com aquarela, colagens, fotografias associadas a colagens, filmes em vídeo, criação de histórias e outras tantas ferramentas.
Nesse passo é importante que se veja a questão e seus múltiplos recursos.
Foi a partir de uma prototipagem da minha visão de como usar a Teoria U e a Arte que nasceu um workshop e um curso com esse tema. A Arte, além de profunda, tem a vantagem de contribuir para a produção de peças que falam muito sobre o autor.
* Cristina Henriques é consultora e coach, formada em Design de Produto, Design Gráfico e Licenciatura em Artes (Educação através da Arte) pela PUC-Rio e pós-graduada em Marketing pela ESPM – Rio. Especializou-se como Consultora pela ADIGO-SP e como coach no curso de Formação de Coaches pelo Instituto Ecosocial – SP. (cristinahenriques@me.com)
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