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coaching — Coaching e garrafada servem pra todos os males?

 

Tenho visto tantas formas de marketing em torno do coaching que acabei fazendo uma associação com aquelas garrafadas de ervas que curam desde unha encravada a “tristezas” de amor. Foi uma conexão inconsciente, motivada, talvez, pelas promessas dos comerciais que vejo sobretudo na internet. Não se trata de julgar as opções de marketing alheias e a forma como cada profissional escolhe se apresentar, muito menos os nichos de mercado a que decidem direcionar a sua atuação, mas imagino que algumas pessoas fiquem confusas e outras cheias de expectativas diante de tanta informação.
O processo de coaching pode, sim, ser mágico. Eu mesma sigo encantada diante dos potenciais e dos propósitos de vida que vejo revelados durante processos. É fantástico mesmo ver um coachee acessar o seu melhor e seguir pela vida com mais plenitude e alegria, conectando-se a sua essência, descobrindo recursos próprios para lidar com as inevitáveis dificuldades do caminho a que se propõe.
Mas um processo de coaching pode mesmo dar conta de tantas promessas? Pode mesmo ajudar a conseguir o emprego, o relacionamento, o sexo dos sonhos, como prometido em anúncios encontrados no Google? Ainda há muita confusão sobre o que é coaching e, por isso, transcrevo a definição da International Coach Federation (ICF), associação global de coaches, com mais de 27 mil membros em cerca de 140 países.
A organização define coaching como “parcerias com clientes em um instigante processo criativo capaz de inspirá-los a maximizarem o seu potencial pessoal e profissional” e acrescenta “coaches honram cada cliente como os maiores responsáveis por sua vida e acreditam que cada cliente é criativo, potente e completo”. Ainda segundo a instituição, a responsabilidade de um coach envolve “descobrir, esclarecer e alinhar-se com o que o cliente quer atingir; incentivar a auto-descoberta; provocar soluções e estratégias geradas pelo próprio cliente, assegurando que o mesmo mantenha-se responsável e ativo no processo”.
Em cada uma dessas conceituações da ICF, percebe-se a responsabilidade e a potencialização do coachee. Só ele pode realizar a “magia” de um processo de coaching. O coach é simplesmente um facilitador que acompanhará cada um de seus clientes movido por um amor profundo pelo ser humano e um interesse genuíno pelo que emerge em cada conversa. Um coach não pode tornar alguém mais atraente, apto, inteligente, feliz, mas certamente apoiará um processo de autoconhecimento em que o coachee descobrirá sua beleza, suas aptidões, seu potencial e seu propósito de vida.
Para tanto, a “varinha mágica” de um coach são as perguntas motivadas pelo desejo de servir e de acompanhar seu cliente nesta jornada que passam, a partir da contratação, a empreender juntos. Ambos, senhores de seus passos, aprendendo continuamente uma forma de viver melhor, o que engloba todas as áreas da vida. Afinal, ninguém consegue segmentar a vida em partes, isolando cada uma delas para que não interfiram umas nas outras. Desenvolvimento de carreira afeta o relacionamento amoroso, a relação com o corpo e tudo o mais que se pode imaginar como aspecto humano. E o inverso é também é verdadeiro. Cada âmbito da nossa vida é interdependente dos demais, e é justamente aí, posso dizer sem medo de errar, que um processo de coaching traz benefícios a todas as áreas da vida.
O importante mesmo, seja para profissionais ou clientes, é entender que não se pode assegurar que os resultados que o coachee estabelece na entrevista inicial serão alcançados. Até porque é muito comum que, ao longo do processo, o próprio coachee resolva revisar esses objetivos e ajustar a rota da jornada iniciada em parceria com seu coach. Além disso, uma vez que uma área da vida seja revisitada, por interdependência, todas as outras recebem seu quinhão de luz e passar a ser olhadas de outra forma. E isso é parte inseparável do processo. Somos humanos e, como tal, complexos e afetivos. Isso, por si só, nos faz repensar essa história linear de que, através do coaching, o sujeito vai do ponto A ao B (ponto desejado) com ajuda do coach. Não somos cartesianos e desconsiderar a complexidade humana, oferecendo resultados padronizados é subestimar a magia do coaching.
Como a garrafada, vendida em feiras livres pelo Brasil, o coaching pode trazer resultados fantásticos a todas as áreas da vida do cliente. Mas tudo depende! A mesma mistura de ervas, isso considerando que tenha havido seriedade e conhecimento técnico em seu preparo, não pode servir para todos os males de todas as pessoas se não houver a crença pessoal, confirmada pela observação das prescrições do erveiro.
Com o coaching não é diferente. Considerando que o profissional seja capacitado e tenha o desejo verdadeiro de servir, os resultados dependerão do coachee e de fatores como sua disponibilidade para mudança, seu comprometimento e sua coragem de dar passos, num ritmo próprio, mas regular, rumo aos objetivos traçados. Depende também da ousadia de reconhecer a necessidade de ajustes do caminho planejado com seu coach-parceiro; e da gratidão por cada conquista, rumo a uma vida mais plena e feliz! E aí sim, com essas recomendações e uma dose de redução de expectativas, coaching vale pra tudo e todos: tal qual a garrafada!

Texto publicado originalmente no site do Capítulo Regional da International Coach Federation – Rio de Janeiro

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