ARTIGOS

Dialogo Pausa pra conversar

Na sua agenda há tempo para boas conversas? Na minha, às vezes, não há! Confesso, envergonhada, que já passei por pessoas, torcendo para não ser vista, só para não ter que parar… e conversar. Afinal, não há tempo a perder quando se trata de dar conta de uma agenda cheia de compromissos e tarefas. Nesta dinâmica – agenda, tarefas, tempo -, estão as oportunidades perdidas.

Desde muito tempo, pensadores enaltecem a importância do outro para a realização humana. O filósofo Espinosa, alertou-nos sobre o impacto do afeto no fazer cotidiano, em nossa forma de seguir pela vida. “Por afeto compreendo as afecções do corpo, pelas quais sua potência de agir é aumentada ou diminuída.” (Ética III) As conversas afetam o corpo, pois, no exercício da linguagem, lançamos mão, conscientemente ou não, de todos os nossos sentidos. Portanto, a cada encontro, a cada conversa, uma afecção ou afeto. E a possibilidade de maior potência para uma atuação mais plena no mundo.
Quem de nós nunca saiu de uma conversa sentindo-se mais animado, com novas visões sobre a vida e com energia renovada para tocar algum projeto? E mesmo que o inverso também ocorra, vale a pena correr riscos. Conversas importantes estão em todo o lugar. Eu já tive insights produtivos para projetos de trabalho depois de uma conversa com pessoas que não tinham nada a ver com o assunto.
No dia em que escrevi este artigo, foi assim. Intencional e ocasionalmente, o dia foi marcado por conversas com pessoas muito diferentes, algumas que não via há tempos. Por isso, algumas tarefas tiveram que ser transferidas para o dia seguinte, mas a minha sensação era de muita produtividade. Tive novas ideias e me senti com energia para atuar em meus projetos.
Conversas têm esse poder: transformam vidas. O que eu me pergunto é se nós, profissionais de comunicação, estamos suficientemente atentos a isso. O fato é que, conscientes do papel das conversações, podemos aproveitá-las muito mais. Rafael Echeverría, em seu livro “Ontología del Lenguaje”, afirma que um dos segredos de se trabalhar e viver com outros é a competência de conceber conversas, aperfeiçoando-se no discernimento de quando iniciar ou encerrar, e de como transitar entre diferentes tipos de conversa. “Estas são competências essenciais na construção não só de famílias harmoniosas e de casais capazes de enfrentar adequadamente seus problemas, como também de organizações empresariais eficazes”, ressalta.
Echeverría descreve alguns tipos de conversas entabuladas diante de desafios, que incluem os imprevistos cotidianos. Apropriarmo-nos dessas distinções aumenta a força da nossa rede de suporte e otimiza os resultados de interações e afetos. Portanto, seguem descrições resumidas:
Conversas com base em julgamentos pessoais – Quando algo acontece, imediatamente emitimos um julgamento sobre o fato e começamos e explicá-lo, atribuindo causas e consequências de acordo com crenças e valores. Quando enveredamos por este tipo de conversa – que inclui aquela que temos com nós mesmos – adiamos ações e nos detemos nas explicações. Procuramos dar sentido a aos fatos, desviando-nos do domínio da ação, onde efetivamente poderíamos transformá-los. Há ocasiões em que utilizamos nossas próprias histórias para manutenção de um estado que precisa ser modificado.
Conversas para coordenação de ações – Aqui tem-se a possibilidade de interferir efetivamente em um fato, modificando-o e dando conta das consequências que possam advir dele. É comum utilizar-se, nesta modalidade de conversa, uma das formas mais eficazes de se dar conta de um desafio: o pedido de ajuda. Ainda que este seja evitado por muitos, que o associam à exposição de fraquezas, é ele quem abre caminho para a soma de potenciais individuais e para as ações transformadoras.
Reconhecer a diferença entre este tipo de conversa e aquela baseada em julgamentos pessoais, permite maior clareza sobre o uso da linguagem e a escolha entre a interpretação e a explicação e a ação efetiva para transformação.
Conversas para ações possíveis – Diante do inesperado, nem sempre se tem a ideia do que fazer ou de como e a quem pedir ajuda. Por isso, se há algo que precisa ser resolvido ou modificado, esta é uma conversa eficaz. Há aqui a reflexão sobre os fatos, não para interpretação ou busca de sentido, mas para descoberta de novas histórias ou possibilidades transformadoras.
Conversas para possíveis conversas – Quantas vezes deixamos de conversar sobre algum fato porque julgamos que nosso interlocutor não está disposto a nos ouvir. Adiamos muitos assuntos porque achamos que nada acontecerá a partir de nossa iniciativa. Neste caso, nada mais oportuno que, mais uma vez, deixar os julgamentos de lado e iniciar uma conversa para abrir caminho para outras conversas. Parece redundante, mas não é! Sem ideias pré-concebidas, com abertura e respeito, pode-se simplesmente perguntar sobre a disposição de escuta, verificando se os julgamentos são válidos ou não.

Texto publicado originalmente no site da ABERJE – Associação Brasileira de Comunicação Empresarial

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